As acusações de Sergio Moro contra Jair
Bolsonaro, que já chegaram ao STF (Supremo Tribunal Federal), têm potencial de
ultrapassar a barreira da crise política, já instaurada com a demissão do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública
na manhã desta sexta-feira (24).
O presidente da ANPR (Associação Nacional
dos Procuradores da República), Fábio George, vê nas denúncias do ex-juiz da
Lava Jato, a possibilidade de que Bolsonaro tenha incorrido em ao menos 3 crimes:
falsidade ideológica, obstrução de Justiça, e crime de responsabilidade.
Segundo o ex-ministro da Justiça, o presidente tentou
interferir politicamente na Polícia Federal e queria “relatórios de
inteligência” das atividades da corporação. Moro também acusou o mandatário de
mentir sobre a forma como ocorreu a demissão de Maurício Valeixo — inclusive em
documento oficial.
Para Fábio George, a gravidade das acusações feitas por um
nome com a relevância de Moro, que até então fazia parte do governo, “merecem
ser apuradas” (leia abaixo cada um das hipóteses de crime que devem ser
investigadas).
No seu último pronunciamento como ministro, Moro destacou
que a “exoneração a pedido”, que consta no documento publicado no Diário
Oficial da União, formalizando a saída de Valeixo do comando da PF, não teve
seu aval e que o ex-diretor da corporação em nenhum momento pediu afastamento
do cargo.
“Em nenhum momento o Valeixo apresentou um pedido formal de
exoneração. Achei ofensivo. Vi depois que a Secom (Secretaria de Comunicação)
afirmou que houve o pedido, mas não é verdadeiro. Esse ultimato também é uma
sinalização de que o presidente me quer fora do cargo”, disse Moro.
A seguir estão os possíveis crimes que serão investigados,
de acordo com o procurador federal Fábio George.
Falsidade ideológica
“Quando me referi à falsidade ideológica, foi ao fato de
que a exoneração de Maurício Valeixo foi a pedido e, segundo Sergio Moro, isso
não ocorreu. Sempre que há um ato que não corresponde à realidade, em tese, a
gente fala em falsidade ideológica. A gente fala em tese porque está ouvindo a
versão do ministro. Mas pela relevância que traz, merece uma apuração”, disse o
procurador federal.
De acordo com o artigo 299 do Código Penal, é crime de
falsidade ideológica “omitir, em documento público ou particular, declaração
que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou
diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar
obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante”.
O presidente Jair Bolsonaro admitiu erro na publicação
do decreto de exoneração de Valeixo com a assinatura de Moro. Ele mandou
republicar sem a rubrica do ministro na noite desta sexta.
Obstrução de Justiça
Para Fábio Jorge, “na ordem em que se busca ter acesso a
documentos sigilosos e se tenta ter acesso a investigações sigilosas,
interferir na condução de investigações pode configurar obstrução de Justiça”. Como se trata de crime comum, o presidente da ANPR explica
que a iniciativa de dar encaminhamento ao pedido desse tipo de investigação
contra o presidente deve ser do procurador-geral da República.
“O procurador
pode atuar de ofício e pode receber representações, como costuma ocorrer de
deputados, senadores, quanto mediante provocação de terceiros.”
Para o procurador, embora não haja uma definição clara do
crime de “obstrução de Justiça” no Brasil, há na lei 12.850/2013, que define
organização criminosa, um artigo específico que pode tipificar o crime no qual
o presidente pode ter incorrido. O parágrafo 1º, do artigo 2º, trata como organização
criminosa “quem impede ou, de qualquer forma, embaraça a investigação de
infração penal que envolva organização criminosa”.
Crime de responsabilidade
“Quando alguém interfere no regular funcionamento de uma
investigação, pode também configurar crime de responsabilidade”, destacou o
presidente da ANPR.
A análise do crime de responsabilidade ocorre no âmbito do
Congresso Nacional. É esse tipo de infração que embasa pedidos de impeachment.
Já há mais de duas dezenas de pedidos de afastamento de Bolsonaro aguardando
uma decisão do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia.
A lei 1.079/1950 define os crimes de responsabilidade e
regula o processo de julgamento de um eventual impeachment.
O artigo 4º define como crimes de responsabilidade aqueles
que atentam contra a Constituição Federal, e, especialmente, contra “a
existência da União; o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder
Judiciário e dos poderes constitucionais dos Estados; o exercício dos direitos
políticos, individuais e sociais; a segurança interna do País; a probidade na
administração; a lei orçamentária; a guarda e o legal emprego do dinheiro
público; o cumprimento das decisões judiciárias”.
Questionado como se comprovar um crime de responsabilidade
na conduta de Bolsonaro, Fábio George ressalta a necessidade de investigação em
uma série de escalas.
“Uma sequência de narrativas precisa ser apurada, de que se
tentou o tempo todo interferir em investigações, impedindo, portanto, seu
regular desenvolvimento. Fala-se em troca de superintendentes, troca de
diretor, em se tentar ter acesso a relatório sigilosos, saber como
investigações estão se desenvolvendo. O conjunto dessas ações mostra
interferência clara de regular o funcionamento das investigações em curso e
isso pode, claro, caracterizar crime de responsabilidade”, argumenta o procurador.
O presidente da ANPR destaca ainda que a preocupação com o
inquérito das fake news que, segundo o ex-ministro da Justiça, Jair Bolsonaro
teria demonstrado a ele, “só reforça, caso verdadeira, a existência do crime de
responsabilidade”. “Aí é uma interferência, inclusive, em outros poderes. Já
existe uma tentativa, não apenas na PF e na regularidade das investigações, mas
também ato de investigação que corre em outro poder. E o conjunto reforça o
crime de responsabilidade”, concluiu.
Esse inquérito do STF está sendo conduzido por 5 delegados
federais. Segundo o jornal Correio Braziliense, agentes dessa
investigação defendem que a operação de notícias falsas contra o STF partiu do
chamado “gabinete de ódio”, comandado no Palácio do Planalto pelo vereador
Carlos Bolsonaro. Os investigadores estariam perto de provar o envolvimento do
02 — o que elevou a tensão de Bolsonaro com o atual diretor-geral da PF,
Maurício Valeixo, demitido nesta semana.
Nesta sexta, o ministro do Supremo Alexandre de Moraes
ordenou que esses delegados continuem no caso, no intuito de evitar trocas no
comando das investigações. Em pronunciamento ao lado de sua equipe, Bolsonaro negou as acusações de tentativa de interferência
política na Polícia Federal e disse que esperava de Moro “informações”
da corporação e não andamento de inquéritos. O presidente também falou em
“pirâmide hierárquica do Poder Executivo” para justificar sua prerrogativa para
efetuar substituições no comando da PF.
Com
informações do HuffPost Brasil.
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